É consensual que um bom e fiável esquema de disponibilização de informação, assente numa perspectiva de diálogo entre cidadãos e os seus representantes eleitos, se apresente como uma ferramenta vital para uma efectiva participação nos processos de decisão.
Neste quadro, há uma garantia comunitária que diz que: “garantir o direito de os cidadãos terem acesso a uma informação clara e completa relativa às diferentes questões que interessam às autarquias locais e de participar nas decisões importantes que comprometem o futuro destas últimas”.
Há que salientar a imprescindibilidade de, numa sociedade democrática a informação sobre o ambiente e sobre os impactos que as actividades humanas nele determinam, ser: proactiva, completa, de fácil leitura, transparente e acessível.
Em Portugal o acesso à informação está consagrado na Constituição da República que a todos reconhece - artigo 37º, nº1 - o direito de informar, de se informar e de ser informado. Todavia, a revisão constitucional de 1989 alarga o âmbito deste direito e, como fica patente no nº2 do artigo 268º, consagra o livre acesso aos documentos, independentemente da invocação ou existência de um interesse directo.
Pela necessidade de responder a estes imperativos constitucionais, os nºs 1, 2 e 3 do artigo 268º - Direitos e Garantias dos Administrados - e por força da transposição de legislação europeia para o ordenamento jurídico português surgiu, posteriormente, a Lei de Acesso aos Documentos Administrativos — LADA — (Lei n.º65/93, de 26 de Agosto, alterada pela Lei n.º8/95, de 29 de Março, e pela Lei nº94/99, de 16 de Julho) que, tendo em conta o objectivo expresso no artigo 1º da Directiva Europeia Nº90/313/CEE: “assegurar a liberdade de acesso e de divulgação das informações relativas ao ambiente na posse das autoridades públicas e determinar a forma e as condições em que essas informações devem ser postas à disposição”, desenvolve no aspecto substantivo o direito de acesso aos documentos administrativos, definindo conceitos, proclamando princípios gerais, delimitando excepções, delineando normas procedimentais do exercício desse direito e determinando a criação da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA).
Para que o acesso à justiça no domínio do ambiente e desenvolvimento sustentável seja efectivo, é necessário que os particulares tenham a capacidade de fazer valer os seus direitos, ou que possam zelar pela reparação de eventuais danos, num quadro judicial que possa prevenir falhas e abusos, sempre que eles sejam acidental ou deliberadamente sonegados. Trata-se, afinal, de garantir ao cidadão comum instrumentos legais que promovam a acessibilidade a direitos garantidos no artigo 268º da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente, nos seus nºs 4, 5 e 6.
No âmbito do artigo 268º/1 CRP exclui-se qualquer “(…) Direito ao segredo por parte da administração, a não ser quando esse segredo reveste o carácter de «dever funcional» legalmente previsto(…)” CRP anotada Gomes Canotilho. Ora uma das questões do acórdão em análise, é saber até que ponto, a cláusula de confidencialidade presente no contrato e o correspondente segredo industrial/ comercial, pode ou não ser aqui integrado, ou se pelo contrário, e como refere o voto vencido, ainda que possa haver confidencialidade relativa a certos documentos, se terá sido violada a proporcionalidade prevista pelo artigo 18º da CRP. A doutrina entende que os direitos previstos no artigo 268º CRP são de natureza análoga aos Direitos Liberdades e Garantias – 17ºCRP – partilham como tal do mesmo regime: aplicabilidade directa e a limitação da possibilidade de restrição apenas nos casos expressamente previstos na Lei fundamental e mediante lei geral e abstracta – 18º CRP- estando essa restrição limitada pela proporcionalidade nas suas várias vertentes.
Relativamente ao 268º/2 CRP, é aí consagrado o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, do qual retiramos um principio de arquivo aberto ou da chamada «administração aberta» – esta garantia estando ou não em curso um procedimento administrativo, é um elemento que reflecte a «democracia administrativa» tornando-se assim um instrumento fundamental contra o «segredo administrativo» tornado claro que a regra é a liberdade de acesso apenas com as ressalvas legais de segurança interna e externa, investigação criminal e intimidade das pessoas.
Ora no acórdão no meu entender, uma das críticas que se pode fazer e que de resto vem expressa no voto vencido, é a de que no caso concreto não foi feita uma verdadeira ponderação casuística entre os direitos fundamentais em conflito, respectivamente: direito à informação ambiental e direito de propriedade e iniciativa privada, com o inerente segredo industrial e comercial, dado que o TC se limitou simplesmente a enunciar o argumento de que o Estado Português naquela situação estava vinculado ao dever de sigilo e a invocar o principio da legalidade a que a Administração Pública está sujeita. Para respeitar o principio da proporcionalidade que o artigo 18º CRP exige, das restrições impostas ao direito de informação o TC deveria ter feito uma apreciação minuciosa e não global relativamente a cada documento em concreto e verificar em quais e porquê se deveria salvaguardar a confidencialidade em detrimento do acesso à informação. Ficou em causa o direito à transparência documental, à administração aberta sem que para isso tenha havido a devida e legítima fundamentação. Poderia ter-se optado por consultar documento a documento e permitir um acesso a título parcial da requerente revelando o que não estaria reservado ao segredo industrial/comercial. Mais, além desta possibilidade, em nenhum momento do acórdão é explicitado que tipo de segredo industrial está em causa nem tão pouco que critérios foram usados para levar à definição dos documentos como tal, dado que isso nunca poderá ficar nem na disponibilidade das partes nem na discricionariedade da Administração sem possibilidade de qualquer controlo por parte do TC, sendo de resto um dos argumentos da requerente na aliena “T”.
Mais ainda, o TC desconsidera por completo a existência da especialidade do direito à informação ambiental, e quanto a mim com a sua decisão pôs em causa um dos princípios fundamentais em matéria de ambiente que é o Princípio da Prevenção.
Sendo o Direito do Ambiente um ramo novo do Direito, importa não descurar a necessidade da formação dos seus profissionais, em particular, das magistraturas, de modo a que se generalize a tomada de consciência da extrema relevância das questões que lhes são presentes para análise e decisão.
Em se tratando do tema ambiental, a sonegação de informações pode gerar danos irreparáveis à sociedade, pois poderá prejudicar o meio ambiente que além de ser um bem de todos, deve ser sadio e protegido por todos. O Poder Público, para garantir o meio ambiente equilibrado e sadio, deve exigir estudo prévio de impacto ambiental para obras ou actividades causadoras de significativa degradação do meio ambiente, ao que deverá dar publicidade; ou seja tornará disponível e público o estudo e o resultado, o que implica na obrigação ao fornecimento de informação ambiental. Não coloco em causa que o segredo industrial poderia no caso reflectir uma restrição ao direito à informação ambiental, coloco sim em causa subtraindo totalmente qualquer informação à requerente senão se terá violado o princípio da proporcionalidade da restrição.
A grande parte dos problemas ambientais e das questões de impacto ambiental têm antes de ser remediadas, precavidas, caso contrário haverá inúmeras situações que já não poderão ser eficazmente resolvidas.
Relativamente a este acesso à informação, a ideia que passa é a de que ela não se tem produzido de forma suficiente, também não se tem divulgado adequadamente aquela que existe e, muitas vezes, se opta por ocultá-la. Passados 10 anos sobre a aprovação da LADA, continua, de certo modo, implantada na Administração Pública a ideia de secretismo, mesmo àquilo que, por lei, tem de ser obrigatoriamente tornado público.
Não se forneceram, pois, “ferramentas conceptuais” para ajudar a descodificar os problemas, nem para nós cidadãos podermos concretizar o nosso direito a um ambiente saudável e correspondente dever de o proteger.

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