Antes de iniciarmos o comentário deste acórdão é nosso dever fazer a seguinte advertência: temos o maior respeito pelos Senhores Conselheiros, pois certamente a sua sabedoria é bem maior do que a nossa. Todavia, a sua decisão, na nossa humilde opinião, leva-nos a à crítica negativa, na medida em que contraria a nossa perspectiva de relação entre os Direitos Fundamentais.
Assim, esta decisão tem características de inconstitucionalidade pelas seguintes razões:
A) O TC pretende colocar em igualdade o direito à informação ambiental e a necessidade de reserva comercial e negocial, subvalorizando assim a autonomia e a especificidade do interesse em causa, que é um interesse qualificado. Tal como refere CARLA AMADO GOMES, tinha um poder-dever de considerar a Conveção d’ Aarhus e também a directiva 2003/4/CE.

B) O TC alega que nenhum deve prevalecer, pois não há uma hierarquia, parece-nos que é precisamente isso que faz ao alicerçar a resolução da colisão numa inexistente ponderação casuísta.

C) O princípio da prevenção ambiental é totalmente desconsiderado, quando é afirmado que deve a empresa laborar e caso venham a existir danos logo se discutirá a prevalência do direito ao ambiente (ponto 7, §3). Isto significa que primeiro não se deixa aceder à informação porque é mais importante preservar o segredo, o que leva a que a empresa possa funcionar sem que haja participação de entidades com especial interesse e elevado conhecimento; depois, se correr mal, remedeia-se.

D) São invocados outros interesses para fundamentar a necessidade de reserva comercial, como o desenvolvimento económico enquanto tarefa fundamental do Estado, quando o que estava em causa não era a impugnação da decisão de construção, mas sim o acesso a documentos que possam elucidar a possibilidade de ocorrerem danos ambientais.

O problema de fundo que encontramos neste acórdão, não é propriamente a inconstitucionalidade ou não das normas em causa, se bem que o artigo 13º, nº1 do DL 321/95, suscita-nos as maiores dúvidas, na medida em que discrimina o investimento nacional em face do investimento estrangeiro, o que parece violador do Direito Comunitário (nomeadamente o princípio da igualdade conjugado com regras sobre concorrência).
Assim, a problemática que nos leva a discordar desta decisão prende-se em concreto com os limites e as limitações dos direitos fundamentais em conflito, tal como aconteceu aos Senhores Conselheiros vencidos.
É ideia base que os direitos fundamentais não são absolutos nem ilimitados, pois nós próprios e a Constituição os conotamos com a ideia de responsabilidade social.
Em alguns casos, o conflito entre direitos fundamentais pode resolver-se logo através dos limites imanentes. Outras vezes resolvem-se pelas restrições do conteúdo por intervenção normativa geral e abstracta do legislador ordinário (leis restritivas). Mas na maior parte dos casos, a limitação ou harmonização tem de ser feita perante o caso concreto.
Não nos iremos debruçar sobre a questão dos limites imanentes nem sobre as restrições ao nível legislativo, pois entendemos que a questão aqui é a harmonização do caso concreto. Ao contrário do que decorre da decisão, não poderíamos ficar ao nível das restrições legislativas, pois as normas em causa não legitimam a restrição total ao direito de acesso à informação, muito menos legitima o não acesso existir uma cláusula contratual de confidencialidade!
Assim, na senda de VIEIRA DE ANDRADE, «não pode ignorar-se que, nos casos de conflito, (…) não é lícito sacrificar pura e simplesmente um deles ou outro». Portanto, daqui decorre que o que o TC deveria ter feito era uma harmonização dos direitos em jogo, ou seja, como é defendido na declaração de vencido do Conselheiro, devia ter analisado documento a documento para efectuar uma «minuciosa “ponderação casuística”».
A recorrente para realizar a sua avaliação ambiental mais do que do clausulado do contrato necessitaria dos estudos técnicos, na medida em que naquele momento a intenção não era opor-se à construção, mas antes saber o que dela poderia vir a resultar para o Ambiente
De tudo isto, entendemos que a recorrente podia ter tido acesso aos anexos do contrato e aos estudos técnicos para efectuar a avaliação ambiental. Todavia, o acesso às certidões do próprio contrato, em face da legislação ordinária que na altura existia e também da cláusula de confidencialidade do contrato (que merece relevo na harmonização mas não é fundamento para o não exercício do direito acesso à informação), deveria ser mantido no sigilo até mesmo para que o Estado não incorresse em incumprimento de deveres contratuais.
Ana Catarina Sabido, st 12 nº 14649

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